26/08/2014

Os sintomas e sequelas de um AVC em crianças.



Jennifer aprendeu a falar aos nove meses. A primeira palavra foi "papai". Dezessete anos depois, emocionou os pais, novamente, ao voltar a falar. Desta vez, a primeira palavra foi "mamãe". Logo que Jennifer nasceu, a mãe Thiene Martins largou o trabalho como caixa num supermercado para cuidar de sua "bonequinha". Toda a atenção era para ela. Jennifer era uma criança inteligente, bonita e cheia de amiguinhas na escola.
Certo dia, começou a reclamar de uma forte dor de cabeça. Foi tomar banho. Quando saiu do banheiro, desmaiou. Como a menina sempre foi saudável, fora uma gripe vez ou outra, os pais correram para o pronto-socorro. O atendimento rápido, em menos de 20 minutos, facilitou o diagnóstico. Jennifer sofrera um acidente vascular cerebral, o AVC. Tinha 12 anos.
O AVC foi do tipo hemorrágico, o mais raro e grave. Acontece quando um vaso sanguíneo se rompe provocando sangramento na área afetada. A maioria das crianças vítimas de um AVC hemorrágico não sobrevive. O caso de Jennifer foi gravíssimo. Por falta de sorte, a artéria danificada afetou a coordenação dos dois lados de seu corpo. Por sorte, ela sobreviveu.
Jennifer ficou um mês e 15 dias em coma induzido e mais dois meses internada. Voltou para casa, no bairro de Inhaúma, na Zona Norte do Rio de Janeiro, sem falar, andar ou mexer os braços e pernas. "Estava imóvel, não reagia a nada", diz a mãe. "Os médicos disseram que eu teria de cuidar de uma boneca de porcelana para o resto da vida."
Nos primeiros anos pós-AVC, Thiene ainda conseguia carregar a menina no colo e levá-la de ônibus ao hospital e a centros de tratamento para as incontáveis sessões de fisioterapia, hidroterapia, fonoaudiologia, entre outras. Conforme a menina foi crescendo, surgiu a necessidade de os tratamentos serem feitos em casa. Mas o plano de saúde não queria arcar com os custos. Para completar, o pai, que era motoboy, sofreu um acidente e ficou impossibilitado de trabalhar. Até que vencesse na Justiça a batalha contra a seguradora, a família dependeu de dinheiro, alimentos, fraldas e remédios doados por parentes e vizinhos.


Jennifer com os pais pouco antes de sofrer um AVC 


Jennifer ficou com sequelas de um grave AVC hemorrágico que sofreu aos 12 anos. Ela é cercada de muito amor e cuidados dos pais. O derrame deixou a família ainda mais unida.

A mãe preferiu continuar a entrevista no quarto, longe dos ouvidos da menina. Por mais que não consiga falar e se locomover, Jennifer é consciente do que acontece ao seu redor. Sabe que perdeu parte da infância e da adolescência. Sabe também que, aos poucos, os amigos e familiares sumiram da vida dos três. Percebe ainda, nas raras vezes em que vai ao shopping, os olhares de estranhamento e de pena pelos corredores. "Fica muito constrangida", a mãe diz.
Por mais difícil que tenha sido a vida, Jennifer está sempre sorrindo. A primeira risada surgiu dias após deixar o hospital. Ao reencontrar seu cãozinho em casa, deu um grito de alegria. "Tem vezes que estamos na cozinha e eu desanimo ou resmungo alguma coisa. A Jennifer responde rindo", diz Thiene. A filha a surpreende a cada dia. "A recuperação é lenta, mas ela já está comendo pela boca (antes, a ingestão era feita por sonda), toma líquidos sem engasgar e balbucia algumas palavras." Esses pequenos sinais de melhora, que para Jennifer são gigantes, dão força aos pais. "Se ela estivesse sofrendo, pediria a Deus para levá-la embora. Mas é alegre e carinhosa, tornou-se uma moça linda. Deus só nos coloca obstáculos que somos capazes de superar. Se Jennifer tivesse morrido na época do AVC, eu não teria conseguido aguentar o tranco. Minha preocupação é com o futuro. Nos exercícios de fisioterapia, sempre peço para ela fazer uma forcinha a mais para se mexer. Já tenho 45 anos, não sei o que será dela quando meu marido e eu não estivermos mais aqui."

Pequeno milagre


Arthur Bruno, de cinco anos também sofreu um AVC. Diferentemente de Jennifer, não ficou com sequelas do derrame. Sua mãe, a auxiliar financeira Paula Meneghetti, achou que o filho nascera com um tique. Desde que segurou o bebê pela primeira vez, ele apertava e soltava a mão direita repetidamente. Seus olhos também faziam movimentos estranhos, como se estivessem revirando. Nas primeiras noites, Arthur Bruno não chorava para mamar, dormia todo o tempo. Ela perguntou aos enfermeiros sobre o comportamento do filho. "Falaram que não era nada de mais", diz Paula. De acordo com a neurologista Maria Valeriana Ribeiro, especialista da Unicamp em anormalidades neurovasculares na infância, o diagnóstico de AVC é mais difícil de ser percebido em crianças do que em adultos. "Os pais precisam estar atentos aos sintomas específicos para cada faixa etária." (Confira os sinais mais comuns no quadro abaixo).


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