21/01/2015

Colapso da economia venezuelana se deve em parte à China.


O jornal Financial Times  publicou nesta quarta-feira (21/01) um artigo onde analisa a crise venezuelana e atribui uma parcela de culpa às relações pouco transparentes com a China. "Toda catástrofe econômica traz um exame de consciência. Quando a Argentina entrou em colapso no final de 2001, O Fundo Monetário Internacional se viu forçado a fazer uma avaliação crítica de seu envolvimento no país. Processos parecidos foram desencadeados no Banco Mundial depois de projetos de desenvolvimento mal sucedidos na África. A implosão da economia venezuelana, que se aproxima, deverá motivar uma introspecção parecida — não no FMI, que esteve ausente desde sua 'expulsão' feita pelo presidente Hugo Chávez em 2007, mas na China", diz a matéria escrita por Ricardo Hausmann, que é diretor do Centro para o Desenvolvimento Internacional na Universidade de Harvard.  
Ele prossegue: "É difícil exagerar a magnitude do colapso venezuelano. As pessoas estão fazendo filas por horas para comprar comida, lojas estão vazias, e o país está numa profunda recessão. A Venezuela tem a inflação mais acelerada do mundo, enquanto a dívida de seu governo é a mais cara para garantir contra o calote. 

Como chegamos aqui? A Venezuela usou o período de alta dos dólares para quadruplicar sua dívida pública externa, com o objetivo de abastecer um boom do consumo interno. Por volta de 2012, quando o petróleo venezuelano valia em torno de US$ 103, o país estava gastando como se o preço estivesse em US$ 194, produzindo  um déficit fiscal de 17,5% do PIB. Essa é o motivo pelo qual a economia mergulhou numa crise no início de 2014, quando o preço do petróleo ainda era de US$ 100. A queda recente conseguiu piorar uma situação irremediável. Quem deu ao país a corda para se enforcar? Principalmente a China". 

"A China começou a fazer enormes empréstimos à Venezuela em 2007. Desde então, emprestou mais do que US$ 45 bilhões, dos quais cerca de US$ 20 bilhões ainda são pendentes. Depois da visita a Pequim no dia 8 de janeiro, o presidente Nicolás Maduro disse que ganhou mais 'investimento'. 

O que torna a China inusitada não é só a soma que está querendo emprestar mas a forma como está emprestando. Em primeiro lugar, Pequim escolheu ser obscura: não sabemos nem os termos dos empréstimos nem o uso do dinheiro. A dívida é reembolsada em petróleo, fazendo os detentores de bônus de Wall Street irem para a China. 

O público venezuelano tem pouca informação sobre onde o dinheiro está sendo gasto. Ferrovias foram  anunciadas mas abandonadas, fábricas nunca foram além da cerimônia de inauguração. Existem acusações de corrupção: em 2013, oito pessoas na Venezuela foram presas por se apropriarem de US$ 84 milhões do fundo da parceria China-Venezuela. 

Em segundo lugar, a dívida nunca foi autorizada pelo parlamento venezuelano devido ao argumento ilusório de que não era dívida, mas "finanças", porque não deveria ser paga em dólares mas em petróleo. Como consequência, gastar dinheiro nunca fez parte do orçamento nacional,  escapando assim de todas as formas de controle e ignorando regras de partilha das receitas do petróleo, que  transfeririam parte dos rendimentos a governos estaduais e municipais de oposição", escreve Hausmann.  

Em terceiro lugar, foi pedido à PDVSA — a companhia nacional de petróleo — para que pague uma dívida de um empréstimo que não fez. Como não conseguiu pagar para forgo o rendimento no petróleo que mandou para a  China, acabou pedindo emprestado o equivalente a dezenas de bilhões de dólares do banco central, potencializando o problema da inflação na Venezuela. 

China ignorou as lições que muitos credores oficiais aprenderam da pior maneira. Há razões que explicam por que esses credores delegam ao FMI a taxação macroeconômica de mutuários: emprestar para políticas insustentáveis apenas antecipa o dia da prestação de contas. 

Se a China tivesse sido prudente, teria garantido que o dinheiro que forneceu foi investido em projetos que poderiam ser pagos por eles mesmos. Em vez disso, os empréstimos só podem ser reembolsados através de uma futura austeridade. 

"Outros bancos oficiais de desenvolvimento aprenderam que pontos políticos ganharam quando empréstimos podem evaporar rapidamente quando é hora de recolher de empréstimos antigos. A China pode ser um novo player em um mundo de financiamento de desenvolvimento internacional, mas tem se comportado, ao menos na Venezuela, como uma versão exagerada do que há de pior do velho financiamento de desenvolvimento", conclui o artigo do Financial Times.

Fonte: Jornal do Brasil

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