20/07/2014

Empresa registra patente de assento de avião para voos de curta duração.


Numa clássica cena do filme "E.T.", de Steven Spielberg, o menino Elliot e seu amigo extraterrestre sobrevoam um precipício numa bicicleta, com a lua cheia ao fundo. O que parecia possível apenas no cinema, começa a tomar forma na indústria da aviação. Não, não assistiremos a bicicletas com asas. Deixe a mágica das telas de lado e se prepare para um cenário bem mais realista – e desconfortável –, em que as fileiras de poltronas nas aeronaves se assemelham a uma grande bicicleta coletiva, sem guidom ou rodas.

É mais ou menos isso que a fabricante de aeronaves europeia Airbus está propondo em um pedido de patente protocolado no Escritório Europeu de Patentes. A inusitada proposta pretende reduzir o espaço entre os assentos, permitindo às companhias aéreas transportar mais passageiros por avião, elevando a receita por voo. Ao mesmo tempo, a nova estrutura é mais leve que a poltrona convencional, contribuindo para a economia de combustível.

No design proposto pela Airbus, o lugar onde o passageiro senta se assemelha ao banco de uma bicicleta, com reentrâncias para as pernas. E o encosto praticamente some: em vez de vir até os ombros, para na altura da lombar. Essa estrutura é presa a barras horizontais enfileiradas, onde também estão os descansos para os braços, única parte do novo produto que ainda lembra uma poltrona de avião tradicional.

Os novos assentos se retraem quando não são usados e podem ser ajustados para que o passageiro busque o melhor ângulo para sentar. Ao que tudo indica, aviões com essa configuração não comportariam serviço de bordo, pois nos desenhos usados para demonstrar o funcionamento do assento-bicicleta não há referência a bandejas retráteis. Ou seja, além de abrir mão do conforto, o passageiro que escolher voar em uma avião assim também correria o risco de ficar sem lanche.

Por enquanto, diz a Airbus, os novos assentos estão em fase conceitual. "Protocolamos centenas de patentes a cada ano. Isso é o que companhias inovadoras fazem. A maior parte delas nunca chega a virar realidade", afirmou a companhia, em nota. No documento arquivado no escritório europeu, a empresa não dá detalhes de largura ou espaço entre bancos. Diz apenas que eles poderiam ser usados em voos de curta duração.

Para Janaína Alvarenga, da Associação de Proteção e Assistência aos Direitos da Cidadania e do Consumidor, o risco de ideias como essa é que elas se tornem um padrão na indústria:

— O brasileiro tende a pagar mais pelo conforto quando viaja de avião. Ele só se sujeita a uma situação menos confortável quando não tem (dinheiro) ou quando não há opção. Nessa situação, o que se pode fazer do ponto de vista de defesa do consumidor é questionar a segurança.

No Brasil, quem atesta a segurança da aeronave é a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Qualquer avião deve passar no teste de evacuação de passageiros em até 90 segundos. Se fileiras apertadas e assentos desconfortáveis não forem empecilho para isso, a princípio, tudo bem.

MAIOR NÚMERO DE ASSENTOS EM ESTUDOS

A Boeing não foi tão longe, mas estuda ampliar o total de assentos de aeronaves modelo 737 MAX 8, a pedido de clientes. Mesmo que isso signifique menos espaço para as pernas. "Um MAX 8 com 200 assentos oferece 11 assentos adicionais com potencial de lucro para as companhias aéreas, além de reduzir os custos operacionais em 5%", diz a Boeing.

A busca por ganhos às custas do conforto do passageiro não é nova. Em 2009, a irlandesa Ryanair criou polêmica ao anunciar que estudava a possibilidade de transportar passageiros em pé, cobrando menos pelo bilhete. Ao que se sabe, o projeto não foi adiante.

Para o engenheiro reformado da Força Aérea Brasileira (FAB) Wilson Cavalcanti, as propostas surgem porque há quem aceite pagar menos por menos:

— Se a ideia da Airbus vingar é porque há demanda de mercado.

Um mercado que vem provando ter imaginação fértil como a do cinema, mas com bem menos encanto.

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